29 de setembro de 2020

A arte de ouvir - parte 2

Sempre que eu sou sincera sobre meu estado mental/emocional, causo algumas reações nas pessoas: pronto, começou o drama; mas de novo essa conversa; um automático posso te ajudar; um sincero como posso te ajudar?; mas precisa se expor assim?; não imaginava que fosse assim, obrigada por compartilhar; me identifiquei, obrigada por dividir; e a reação que mais me importa, organizo meus pensamentos.

A todos os meus amigos, eu não sei como ser ajudada. Obrigada, mas eu não sei como você pode me ajudar.

Hoje eu pensei e concluí que tudo que é dito é um aviso. É um sinal. Um alerta vermelho. Ainda que pra mim mesma.

Mas as pessoas não ouvem pra compreender, ouvem pra argumentar: por que vc não faz isso? Você já tentou aquilo? Por que você deixou chegar nesse ponto? Faz um pouco por dia. Você tem que tentar ser feliz. Precisa fazer exercício. Falta um propósito. Engole o choro, seja adulta. E se você...

Soluções bem intencionadas e ótimas, tenho conhecimento de todas. Mas, esquece a lógica (sobretudo a sua) porque não é assim que funciona.

Se você leu a parte 1, eu funciono assim pra muita coisa na vida: não tá bom, mas não tá ruim; tá ruim, mas não tá péssimo; tá péssimo, mas não tá insuportável; tá insuportável, mas eu aguento; eu não aguento mais, mas sou acomodada; deu.

No quesito depressão e tudo que envolve isso eu to no "tá péssimo, mas não tá insuportável"em 90% do tempo, "deu"e não no bom sentido em 1% do tempo e o resto do tempo oscilo entre as fases.

Vou começar com um exemplo leve: lixo reciclável, aquele que não suja, não fede, não cheira. Só bagunça. Um dia é uma sacola do ifood que eu deixo no painel da tv. No outro eu comi um salgadinho e deixei na bancada. No outro, abro uma encomenda e largo no corredor.

De repente, tá tudo tão lotado que as coisas começam a cair no chão. Até que eu mesma começo a colocar as coisas no chão. Então, é como se minha casa toda fosse um grande lixo. Se eu terminar de beber uma garrafinha de água, onde eu estiver, vou largar. Soltar mesmo. Como quem joga no lixo, mas eu jogo no chão.

E eu ando pela casa desviando das coisas, posso escorregar e quase levar o maior tombo da minha vida, mas me recomponho e o lixo permanece lá. Às vezes eu empurro pro canto e o lixo continua lá.

Um belo dia, aquilo me irrita e eu junto tudo. Pode se uma semana, pode ser um ano. A última vez que o fiz, eu juntei isso só da sala. SÓ DA SALA!!!


Se você ainda pensa que "é só não sujar, assim não precisa limpar", você não tá ouvindo pra compreender, você tá ouvindo pra argumentar.

Beijos,
Betty.



A arte de ouvir - parte 1

 Uma vez eu ouvi que as pessoas não sabem mais conversar porque ao invés de ouvirem para compreender, elas ouvem para argumentar. O famoso "com duas pedras nas mãos".

É cada um com as suas verdades; melhor mesmo seria conversar com o espelho, mas isso também não é funcional. Não resolve as questões.

E aí você faz o que? Sorri e banca a Monalisa?

Daí um dia você muda e pros outros foi "nossa, mas não teve nem um aviso", mas pra mim foi: não tá bom, mas não tá ruim; tá ruim, mas não tá péssimo; tá péssimo, mas não tá insuportável; tá insuportável, mas eu aguento; eu não aguento mais, mas sou acomodada; deu.

Esse é basicamente um cronograma dos problemas da minha vida. Algumas coisas já beiraram uma década pra eu dar um fim. E pode ter certeza que nesse processo todo eu dei avisos até demais. Mas as pessoas não ouvem pra compreender, elas ouvem pra argumentar.

Beijos,

Betty.

22 de janeiro de 2020

Depressão e "tarefas impossíveis"


Graças à Jubs (obrigada) caí nesse link e me reconheci tanto naquelas palavras - sobre coisas que eu sempre tive dificuldade de explicar para as pessoas - que, naquele dia, chorei de soluçar. Não foi de tristeza, mas de alívio, de saber que não sou a única e finalmente pude entender por quê não faço algumas coisas e outras eu enrolo até que não dê mais.

Alguém me perguntou: mas isso não é proclastinar? Eu sempre pensei que fosse. Isso ou preguiça, apesar de saber que não pode ser uma das duas coisas você não ser capaz de levar uma embalagem de sorvete para o lixo e depois de muitos dias, poder saber quantos sorvetes você chupou ao contar as embalagens espalhadas pela mesa e chão da sala. EU CONTEI porque achei que tinha vindo menos do que eu comprei, mas não aproveitei pra juntar e levar pro lixo. Isso aconteceu quando eu ainda morava em Londrina e a coisa ficou muito, mas muito pior aqui em Curitiba.

Aqui é o artigo do Bored Panda sobre o Thread da Molly Backes. Não deve ser muito empolgante ler se você não sofre disso. Mas se quiser entender alguém próximo que passe por isso, eu recomendo. Inclusive os comentários.

A empatia é algo realmente a ser praticada. Quando eu me reconhecia, pensava: é assim mesmo!; quando eu fazia algo de boa, pensava: mas vc não consegue fazer isso?

Entende a loucura? Por isso eu compreendo que é muito difícil as pessoas me entenderem e acreditarem que não é pura preguiça ou desleixo.

Tradução livre: as tarefas impossíveis raramente são algo realmente difícil. É algo que vc já fez uma centena de vezes. Por isso é tão difícil pra quem está de fora ter empatia. "Por que vc não faz logo e se livra disso?", "Isso não levaria mais do que 20 minutos", OH nós sabemos!

Quem está lutando contra depressão, ansiedade, etc, podem não ser capazes de pedir ajuda porque estão muito envergonhados. Tudo bem. Nesses casos, deixe a porta aberta e, nesse meio tempo, os ame muito.

Se você está lutando contra uma ou várias tarefas impossíveis, vc não é louco, vc não é preguiço e vc não está sozinho. Tente ser gentil consigo mesmo. O contrário não ajuda. Considere pedir ajuda. Algumas vezes, só o fato de ter alguém junto durante a tarefa ajuda muito.

Sábado passado, minha irmã só avisou: estou indo aí. Na hora foi algo fora da minha zona de conforto. Mas depois, consegui fazer algo que estava me incomodando há mais de um ano. Me livrar da pilha de roupas de cima de uma das camas. Com a ajuda dela, separei muita coisa pra doar e, no domingo, terminei de organizar o armário, separar mais coisas pra doar e ter o prazer de ver a cama vazia.

Agora to numa onda de "quero fazer isso com o resto da casa"e espero que ela dure até eu conseguir terminar tudo. Mas, nunca sei.

Nessa de organizar, encontrei umas fotos (e muitas outras coisas que eu nem lembrava que estavam sumidas). Pensei: vou colocar nos meus porta-retratos. E isso me levou a esse post.

Os porta-retratos maiores, eu comprei porque gostei e estavam baratos. NUNCA usei. Antes ficavam na gaveta e FAZ ANOS que estão expostos pra ver se eu imprimo algumas fotos, mas nunca funcionou.

O menor, preto, ganhei do Rodrigo quando me mudei pra cá. Era pra colocar foto de todos e deixar na minha mesa nova.

Até ontem, estava com a foto que veio, de modelos desconhecidos.

Betty, mas vc não tem vergonha de contar essas coisas todas? Eu já tive um dia, mas hoje eu percebo que não ter do que me envergonhar é o primeiro passo para buscar a cura e também ajudar a conscientizar as pessoas sobre o que é ser uma pessoa com depressão. Se funciona? Espero muito que sim.

Beijos,
Betty.

13 de janeiro de 2020

Para Marias

Ontem, uma Maria morreu.

A morte é doída porque se despedir de quem amamos dói. Imagine então, para sempre. Imagine então, repentinamente. Imagine então, se a Maria escolheu morrer.

Ontem eu chorei porque, por uns segundos, eu a invejei. Depois chorei porque pensei em todos que me amam. E chorei imaginando o quanto ela sofreu com essa dualidade entre "fazer o certo"e escolher esse caminho.

Eu sempre digo que não se preocupem, porque não vou me matar. Como eu sei? Porque na minha escolha (balança), por pior que sejam os contras, os prós sempre serão maiores. Ainda sobre escolhas, ontem li uma verdade num comentário. Quem está decidido, vai fazer e ponto. Não há nada, absolutamente, que você possa fazer, a não ser virar uma sombra 24h e isso também não é vida. Então, não se culpe. Perdoe a pessoa pela escolha dela também; não é egoísmo querer que o insuportável pare. Não vivam com esses dois pesos.

Outra constante nos comentários é ser surpreendido porque a pessoa era feliz, ativa, funcional, não demonstrou nenhum sinal. Nós somos ótimos atores. E nem sempre é atuação. Em muitos casos, chamo de energia seletiva.

A foto abaixo é de uma mini samambaia que morreu faz alguns meses e seria só pegar e jogar no lixo. Mas eu não o faço, porque o meu Não é maior do que meu Sim. Não interfere na minha vida, nem na vida dos outros. Já, se um amigo pede pra eu tirar todas as plantas mortas da casa dele, limpar o quintal e plantar flores, eu vou lá e faço.

Se eu pego um freela, faço no último do último minuto, quase sofrendo. Se tem que fazer 20 mil horas extras no trabalho, eu faço com um sorriso no rosto. Viu, energia seletiva.

Você sabia que há bulas de antidepressivos, cujo possível efeito colateral é aumentar as chances de suicídio? Não é muito louco isso? Quando questionei a psiquiatra, ela me explicou que há pessoas que estão tão mal e apáticas, que quando sentem a melhora, não querendo voltar para onde estavam, aproveitam o momento de energia dado pela medicação para morrer. Ou seja, existem casos, mas não pinte um estereótipo de pessoa triste que não sai da cama, quando alguém falar que tem depressão, para duvidar do que ela está passando.

Minhas palavras hoje são pra muitas Marias.

Pra de ontem, desejo que tenha encontrado a paz.
Pra Maria-eu-e-muitas-iguais, procurem ajuda profissional.
Pra Maria-amiga, saiba que não há forma de ajudar, se a pessoa não quiser ajuda. Mas, ouvir sem julgar (não precisa encontrar soluções, nem dar respostas "certas") e fazê-la se sentir acolhida (com atitudes, não só com palavras) já é uma grande ajuda.
Pra Maria-sabe-tudo, se sua opinião não for acrescentar nada, fique calada. Muito ajuda quem não atrapalha.

Beijos pras Marias,
sejam elas homens, mulheres, adultos ou crianças.